Análise de 'Coqueiral', de Matilde Campilho
Imagem por Thaís Costa |
COQUEIRAL
A saudade é um batimento que rebenta assim
vinte e oito vezes desde meu ombro tatuado
de desastre até à rosa pendurada em sua boca
E o amor, neste caso específico, é um mergulho
destemido que deriva quase sempre de uma nota
climática apenas para convergir no osso frontal
do crânio do rei da ilusão – terno é o seu rosto
Senhor, os ossinhos do mundo são de mel e ouro.
Lendo pela primeira vez ‘Coqueiral’, de Matilde Campilho, o que salta aos olhos é
a ideia do amor que a poeta desenvolve - amor cuja distância não é capaz de apagar.
Salienta-se essa face, logo na primeira estrofe: “a saudade é um batimento que rebenta
assim”. Ao chegar em um corpo a corpo com o poema, atenta-se para outras questões, até
então invisíveis, no texto.
A distância entre o coqueiral e o mar, título e corpo do poema, seria, possivelmente, a
distância entre os amantes. O espaço entre eles não parece ser físico, como o coqueiral e o
mar, mas sim sentimental, em que se ressalta a diferença entre ambos.
Transcorre daí que, para além de distante, trata-se, similarmente, de um amor não
duradouro ou uma paixão. O envolvimento, sentimento, está associado a uma experiência
infeliz, uma vez que há uma imagem caótica do mergulho que deriva de uma nota climática
(sol) e que é convergido no crânio. Suscita, portanto, a interpretação de que esse amor/paixão
é uma ilusão, mas que essa dualidade é importante para construir um esqueleto - “os ossinhos
do mundo são de mel e ouro”. O mel e o ouro são elementos da mesma cor, mas com valores
bem diferentes, assim como o amor e a ilusão.
É um poema de movimento e tragicidade. O teor trágico fica representado pelo agito
do mar, que demanda um mergulho destemido.
Thaís Costa
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