CONTO: 'Cérbero', de Eduarda Rocha

by - fevereiro 26, 2021

 

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CÉRBERO

    Em uma família da periferia composta de pai, mãe, dois filhos homens já casados e a caçula atrevida que ainda convivia com os pais, o olhar atento da menina corria sempre para as inúmeras discussões ocorridas no conforto do lar. O amor cortês compilado a todo o narcisismo universal estava no coração de seu pai, e ela sabia disso! Traições, filho fora do casamento, boemia regada a uma vida de problemas com drogas e álcool, o rei na barriga e um machismo de colocar futuros messias no chinelo. Assim era a delícia da vida dessa menina, o julgamento contra sua mãe era diário, mas ela sabia que para aquele mar de rosas, que sua progenitora vivia havia explicações. Muito nova. Uma gravidez não esperada. A morte de sua mãe. Um choque. Uma vida inteira desperdiçada em um casamento inútil com um marido que passou a tomar todas as decisões por ela e delimitar suas diretrizes.

Pensar essa situação é olhar muitas mães dentro dos seus lares, a manipulação exercida por aquele pai recaía por todos os membros da família, uma serpente que enrosca sobre seu corpo contraindo tão forte os seus músculos que você fica paralisado, SEM VOZ, todavia, para os maldosos, os astros se encarregam do castigo. Em mais de um episódio que ocorrera de descoberta de adultério, a mãe pediu para que o pai se retirasse de casa, isso mais parecia um disco arranhado que voltava para mesma canção, a traição era nova, mas o constrangimento e deslealdade era de sempre. Nesse momento, mãe e filha criam uma união que nunca havia existido, quando o empoderamento infiltra-se no pejorativo sexo frágil é o estopim. A partir disso o pai deu início aos jogos vorazes tentando colocar parentes contra essa mulher, os próprios filhos homens que não pensaram nunca em apoiar sua mãe, como a menina fez, suas manipulações dizendo que foi abandonado e que se arrependia da traição e que nunca mais faria isso.

É estranho presenciar pessoas que sofreram tanto acostumar-se com o sofrimento, passado um tempo a mãe estava quase deixando o pai retornar para o seio daquela família leprosa, entretanto, aquela filha embebida de raiva dá início a uma guerra tentando de todas as formas fazer com que sua mãe vencesse os 4 rounds da Solidão. O tempo passou, o rompimento foi mantido, mas as cicatrizes passaram a deitar-se no lado esquerdo da cama, a vida de dor deixa rubricas. Triste foi ver somente Herácles, Orfeu, Eneias, Psiquê e Ulisses sendo os únicos a dizer adeus.


                                                                                                                       Eduarda Rocha

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